14 de fev. de 2009

Logomarca e a discussão vazia

Alguns podem alegar que o que eu disse vai contra tudo o que os designers estudaram sobre identidade, que eu estou defendendo más práticas profissionais, que estou incentivando as pessoas a prosseguirem usando termos incorretos que podem minar o respeito pela profissão, que eu sou a favor de usar termos errados, e que estou do lado dos amadores que aprendem 2 ou 3 receitinhas de design e saem por aí dizendo que são designers que fazem “logomarcas”.

Para quem já leu os meus demais posts, sabe que nada poderia estar mais longe da verdade, pelas razões que aponto a seguir:

Eu não sou a favor de sair por aí usando termos incorretos. Pelo contrário, eu gasto bastante tempo aprendendo quais termos devem ser usados e como isso se traduz em melhores práticas de projeto e atuação profissional. Diferente de muitos que dizem “isso significa tal coisa” eu prefiro dizer, baseado na literatura, que “isso tem potencial para significar”. Também uso expressões como metáfora experiencial, conotação cultural, e ao invés de dizer “fonte” eu prefiro dizer “face tipográfica”.

Mas eu não uso essas e outras expressões como lenha para acender uma fogueira de debates sobre palavras, e que não levam a nada, pois isso só sustenta a falsa impressão de que “se eu não falo logomarca, então eu não faço parte do grupo de amadores, logo sou designer gráfico de valor”. Eu uso, sim, os termos adequados no meu cotidiano como designer e professor, mas não coloco isso como prioridade. Diferentemente de outros “pseudo-designers”, que gastam mais energia debatendo sobre usar ou não logomarca, enquanto seu porfolio demonstra que suas ações não correspondem ao seu discurso. Ou seja, muitos tem um discurso bonito, defendendo o uso das palavras “certas”, dos termos “corretos”, mas se você olhar o portfolio destes, verá que aquela conversa toda não se reflete nos trabalhos que eles fazem.

Na década de 64, na Inglaterra, Ken Garland publicou um manifesto chamado “First Things First”, que em português seria algo como “Em primeiro lugar, as coisas principais”. Ele sugeria que alguns designers estavam usando seu conhecimento para finalidades comerciais, deixando de lado outras coisas mais importantes, e que precisavam do design, como saúde, educação, dentre outros. Garland fez questão de dizer que ele não era contra o uso do design para apoiar as vendas, mas sim que o design não estava dando atenção às necessidades principais do ser humano.

Seguindo o mesmo raciocínio, eu digo que não sou contra o uso dos termos corretos. Não sou contra os designers que passam 4 ou mais anos estudando para fazerem projetos com precisão e usando termos adequados para se comunicar com outros designers e a sociedade. Não estou do lado dos amadores que aprendem 2 receitinhas e saem por aí dizendo “faço logomarca”. Mas eu também não apóio os designers que gastam saliva com um discurso de um argumento só, e que é repetido sem muita atenção: “falar logomarca é errado”. Enquanto estes ficam lá na praça, com os braços erguidos, segurando a Bíblia do Design na mão, jogando uma maldição sobre quem falar aquela “palavra” maldita, seus projetos de design de identidade continuam um lixo, que também mereceria um castigo.

Com isso, quero dizer que:
1) Dificilmente um cliente fala errado apenas a tal “palavra” maldita. Ele também diz outras coisas, que obviamente são reflexo da sua ignorância sobre o assunto. Ao invés de ficar repreendendo seu cliente, se concentre em fazer seu trabalho direito. O exemplo fala muito mais do que palavras. Uma criança, desde cedo, já sabe que muito mais importante do que ouvir seu pai dizer “não jogue lixo no chão” é vê-lo se agachar, apanhar o lixo e jogar dentro da lata. Ou seja, diante dos exemplos e da ação, as palavras tem uma força muito menor. Um cliente que ouve você dizendo que tal palavra não é correta, mas também vê você entregando um “projeto de identidade” ridículo, vai ignorar seu discurso sobre o que deve ou não ser dito. Agora, se você entrega um projeto desenvolvido adequadamente, com os nomes apropriados, ele poderá dar crédito ao que você diz.

2) Se outro designer usa um termo que você considera incorreto, em primeiro lugar, pense duas vezes antes de afirmar que ele está errado. Você pode ter uma surpresa.

3) Se um designer precisa ser “ensinado” a não dizer isso ou aquilo, é provável que o trabalho dele esteja numa situação bem pior do que as palavras que saem da boca deste. Pois o que a boca fala é um reflexo do que o designer pensa. Se as palavras estão cheirando mal, os pensamentos já devem estar podres há muito tempo. Logo, antes de corrigir as palavras, corrija as atitudes e as idéias que deram origem ao que o designer falou. Ao invés de falar “não diga logomarca”, mostre ao designer quais são os elementos da identidade visual (código de marca), como eles estão relacionados com os conceitos da marca (DNA), como eles se combinam para refletir a linguagem e o estilo nos pontos de contato e impacto de marca, como isso deve ser documentado, como deve ser implementado no dia-a-dia da comunicação, como deve ser transmitido para todos as partes interessadas (stakeholders) etc. Ou seja, saia da ponta do iceberg, e mergulhe fundo no oceano, para verificar que há coisas bem mais complexas para serem resolvidas, e que um simples nome não é a origem nem o remédio dos males no design.

2 comentários:

Unknown disse...

Bom artigo. De total acordo. Ultimamente, tenho pesquisado muito na internet sobre esta questão justamente para tentar ter uma posição definitiva e que desmistifique de vez essa bobagem que "logomarca é errado".
Existem coisas mais importantes e inteligentes para se preocupar.

Unknown disse...

Bom artigo. De total acordo. Ultimamente, tenho pesquisado muito na internet sobre esta questão justamente para tentar ter uma posição definitiva e que desmistifique de vez essa bobagem que "logomarca é errado".
Existem coisas mais importantes e inteligentes para se preocupar.